quarta-feira, 19 de outubro de 2016



                                                                                                              
                                                            II Congresso Almada 
                                                                        João Vicente
                                   Presidente da Direcção da CPPME
                                                 Almada, 16 Setembro 2016

Senhoras e senhores,

Falo-vos na qualidade de dirigente, da Confederação Portuguesa das Micro Pequenas e Médias Empresas (CPPME).

Falo-vos com o enquadramento temático - Trabalhar em Almada - e sob o denunciado objectivo de promover o direito ao trabalho com direitos, qualidade e segurança.

Antes de mais, importará, evidenciar as linhas de contacto que definem o paralelismo e a interacção que, com absoluta inevitabilidade, se estabelecem nos estados, de força ou fraqueza, do trabalho, do emprego e da empresa quando micro e pequena, já que, quando grande empresa, à sua pujante saúde, corresponde, com lamentável frequência, a debilidade e a insegurança do emprego.  (*)

Através de rápido percurso, por inquestionáveis dados estatísticos, tão só, ao longo da primeira metade da década em curso, facilmente concluímos pela desventurada interacção a que acabo de aludir.

Assim:
É verdade que mais de 99% do universo empresarial do nosso País é constituído por micro e pequenas empresas.

No decorrer da verificada e penosa evolução da economia Portuguesa foi esta parte, do referido universo, que registou constantes alterações. Pequenas empresas que encerram as suas portas ou caiem para micro, e micro que estiolam, reduzindo o emprego a pouco mais que o do provável velho empresário.

Em simultâneo, o desemprego gerado, vai convertendo, precipitadamente, parte significativa dos desempregados, em novos micro empresários, embalados por doce ilusão que,  2 - 3 anos de actividade, transformam em amarga realidade. Cabe referir que o tempo médio de vida, de mais de um terço dessas empresas, não excede esses 2 - 3 anos.

De novo desempregados e sem o pé de meia, da eventual indemnização de quando haviam caído no desemprego, estes já, ex-empresários, vítimas da destruição sistemática a que o aparelho produtivo tem estado sujeito, são arrastados para um beco sem saída.
  
Os que sobrevivem para além dos 2 - 3 anos como empresários, normalmente em nome individual, na sua maioria, labutam sem quaisquer direitos sociais, não geram emprego, mas vão contribuindo para falsear as estatísticas sobre o desemprego.

Não é, também, menos verdade que, apesar de se tratar de mais de 99% do universo empresarial, representam menos de 60% do emprego e de 40% do VAB. Se considerarmos sómente os empresários individuais, com forte impacto nas micro empresas, verificamos que representando 68% do total das não financeiras, no emprego, correspondem a menos de 25% e no VAB, a pouco mais de 8%.

Embora reconhecendo que à elevada e crescente taxa de auto emprego, nas micro, registada nos últimos anos, corresponde o, também registado escasso desenvolvimento, não podemos deixar de salientar que as economias europeias mais fortes, têm, tal como o nosso País, um universo empresarial, onde as micro e pequenas, representam muito mais que 90%. Assim sendo, nada mais falacioso que a ideia, reiteradamente propalada, que os problemas da produtividade e da competitividade da economia portuguesa radicam, no essencial, na profunda pulverização do tecido empresarial.

Esta falaciosa linha de pensamento, tem origem e marca conhecidas. Recordo que em 2012, em audiência com o então chefe do governo, tivemos de ouvir, no tom categórico de estadista de pacotilha, que era inevitável, porque necessário, o encerramento de parte significativa das micro e pequenas empresas deste País. Reconheça-se que o lamentável objectivo governamental, desgraçadamente, foi conseguido.

A verdade que mais importa destacar, porque indesmentivel, situa-se nas políticas seguidas por sucessivos governos, essas sim, responsáveis pela ingovernabilidade da maioria das micro e pequenas empresas e, pelo oásis colocado à mercê das grandes, sejam elas nacionais, sejam elas multinacionais.

O resultado de tais políticas pode ilustrar-se com os muitos diabos que o anterior governo infiltrou no quotidiano do mundo do trabalho e que, o actual governo, demora a expulsar.

É obra do Diabo que os 3 sectores com produtividade mais elevada (cerca de 84.000 euros por trabalhador) vão sendo sonegados à esfera pública e capturados pelo grande capital. Trata-se dos sectores de energia e águas, informação e comunicação, transportes e armazenagem.

É obra do Diabo que o mais apetecível destes sectores, com produtividade acima dos 150.000 euros por trabalhador, tenha já proporcionado negócios da China, crimes públicos por julgar, tal como muitos outros dos mesmos protagonistas.


É obra do Diabo que nos primeiros cinco anos da década, 

- O PIB tenha caído 7%
- O desemprego tenha crescido quase 70%
- A  Formação BCF em percentagem do PIB, tenha descido de 20,5 para
  14,6%
- A  dívida pública também em % do PIB tenha subido de 96,2 para mais de
  130%
 - O serviço da dívida de 5.268 M de euros em 2010 atinja os 8.580 M em 2014
 - O IRS tenha subido mais de 24% e o IRC tenha baixado mais de 12%
 - O excedente bruto de exploração (lucros) tenha subido 5% e o rendimento do 
   do trabalho tenha caído quase 9%.

Por obra e desgraça, de tais e tantas obras do Diabo, 5 anos bastaram, para atirar, para debaixo do limiar da pobreza, mais 700.000 portugueses e para gerar um saldo, profundamente preocupante, do somatório dos saldos fisiológico e migratório ( deficit de 93.000, no contributo para a renovação etária, e menos quase 140.000 quadros de elevada formação e capacidade profissional, valioso capital humano que o País, criminosamente esbanjou, quando a única porta que lhe abriu, foi a da penosa emigração.

Por tais e tantas obras do Diabo, o Estado Social foi minguando com forte impacto nas condições de vida das classes trabalhadoras. Se em 2012, a Educação, o Serviço Nacional de Saúde e as Prestações Sociais contaram com mais de 26.500 M de euros em 2015 tiveram de se contentar com menos de 23.300 M.

Está a iniciar-se a discussão em torno do OE para 2017.

Contribuir para o emprego é reclamar, tal como faz a CPPME, nomeadamente:

           - aumento do investimento público
           - estímulo ao mercado interno
           - medidas de aumento do poder de compra
           - extinção do PEC e implementação de índices técnico - científicos
           - ajustes no regime simplificado
           - redução progressiva do IVA
           - introdução do IVA de caixa de modo efectivo.
           
Sendo certo, decisivo e já demonstrado, o impacto da acção do poder central (legislativo e executivo) na vida deste importante e maioritário segmento da sociedade portuguesa - trabalhadores por conta de outrem e micro e pequenos empresários -  não é menos certo que o poder local, por acção directa, por pressão junto das instâncias do poder central ou por pedagogia, através de práticas exemplares, pode e deve contribuir, para amenizar o estado de desgraça das classes menos favorecidas.

O somatório de pequenas acções pode valer como grande contributo. A propósito, destaco o seminário realizado a 7 de abril no Fórum Romeu Correia, por iniciativa da CPPME e, só possível, com o inestimável apoio do Município de Almada.

Estiveram, então, em debate, o OE 2016 e suas previsíveis consequências, Almada no Plano Estratégico para o Turismo na Região de Lisboa e a Economia Fiscalidade e Empresas.

O debate que então ocorreu, com forte participação de micro e pequenos empresários, evidenciou carências, listou medidas a reclamar do poder central e, acima de tudo, testemunhou a determinação mobilizadora de organizadores e participantes.

Finalmente e em retoma dos possíveis contributos do poder local, para o âmbito e qualidade do emprego, e considerando que emprego e emprego com qualidade só são  possíveis com desenvolvimento,  e que, desenvolvimento sustentado implica prioritariamente o crescimento do mercado interno, e que, o crescimento do mercado interno só é exequível através de micro e pequenas empresas saudáveis, e ainda que, a saúde e crescimento harmonioso dessas empresas e desse mercado, dependem, em grande medida, dos municípios, enquanto instituições da maior relevância no espaço que lhes está afecto,

deixamos uma simulação que pode reflectir, eficácia e boa pedagogia ou, o seu contrário.

Admitamos que uma qualquer autarquia (qualquer que seja, é sempre de relevante importância económica e social), lança um Concurso Público.

Nos respectivos, caderno de encargos e programa, estabelece, por norma, os critérios para selecção da proposta concorrente de maior vantagem economica.

Nesses critérios inclui o preço e múltiplos outros factores de carácter técnico passíveis de valorizar ou desvalorizar a proposta.

Se, por exemplo, o preço base (valor máximo admissível a concurso) corresponder a não mais que 50, 60 ou mesmo 70% dos encargos, com os recursos humanos exigidos pelo concurso, mesmo presumindo custos unitários com base no salário mínimo nacional, então, neste caso, estamos perante uma autarquia de práticas que refletem ineficácia  e má pedagogia e convidam ao trabalho sem direitos, sem qualidade e segurança.


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