Jornal “Rostos” 01-07-2015
entrevista
João Vicente, Presidente da Direcção da CPPME
MPME onde se situam mais de 70% dos empregos do Distrito de Setúbal.
Conciliar o que era e é conciliável - micro, pequenos e médios empresários
. Fundos Europeus-2020 - expectativas são de escasso optimismo
“O tecido empresarial da península de Setúbal, com cerca de 70.000 empresas, é constituído em mais de 99% por micro e pequenas unidades e salpicado, tão só, por pouco mais de uma dezena de grandes empresas”, sublinha João Vicente, Presidente da Direcção da CPPME- Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas.
João Vicente, Presidente da Direcção da
CPPME- Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas, em entrevista ao jornal
«Rostos», faz um balanço de 30 anos de actividade e perspectiva intervenção
para o presente e futuro.
Conciliar
o que era e é conciliável - micro, pequenos e médios empresários
Que balanço faz de 30 anos de actividade
da CPPME?
“Em jeito de nota introdutória dir-lhe-ei que o balanço balança, entre o
positivo e o negativo.
Positivo pela capacidade e dedicação da minoria activa que, empenhada em varrer
de vez, para a lixeira da história, as tentativas de reorganização corporativa,
10 anos após o 25 d´Abril, propôs, formas de associação que, para além de
compatíveis com as mais elementares regras de vivência democrática, visavam
reunir, exclusivamente, empresas e empresários com interesses convergentes.
Os fundadores desta confederação ( CPPME ) pretenderam, única e justamente,
conciliar o que era e é conciliável - micro, pequenos e médios empresários.
Dar-lhes força, mais e melhor espaço de acção, através do movimento
associativo.
Negativo pela apatia e/ou pelo exacerbado individualismo de, não poucos,
pequenos empresários que, pela sua passividade, foram abrindo caminho ao
oportunismo das associações patronais, controladas pelo grande capital e que
deles, se vêm servindo, como adereço decorativo.
Negativo também porque, ventos e marés, soprando do interior da Europa,
encaminhados por sucessivos governos em relação promíscua com as associações
empresariais do grande patronato, foram reduzindo, crescentemente, o espaço de
actuação das MPME.
Foram 30 anos de resistência em contexto adverso. A entrada na comunidade
europeia, o tratado de Maastricht, a adesão ao euro e a chamada constituição
europeia foram rombos sucessivos na soberania do nosso País.
As portas abriram-se, de par em par, aos objectivos colonizadores dos países
mais ricos.
Iniciou-se a destruição do tecido produtivo e com ela abriu-se uma verdadeira
auto estrada através da qual chegou o sonho europeu que, de pronto, virou
pesadelo.
As bolsas de pobreza alastraram em contraste com a escandalosa exibição de
riqueza de uma nova minoria colaboracionista.
O mercado interno, onde a maioria esmagadora das micro e pequenas empresas se
situa, veio estiolando a ritmo uniformemente acelerado.
Cresceu, sem parar, o número de empresas que encerraram as suas portas,
reduziu-se a produção e aumentou o desemprego.
Os ventos que têm soprado, empurram-nos a nós, micro, pequenos e médios
empresários mas também, o País, no seu todo, para o abismo.”
Destacar
a sua importância social e económica
Qual a importância das MPME no distrito de
Setúbal?
“É, ainda é, de extrema importância.
O tecido empresarial da península de Setúbal, com cerca de 70.000 empresas, é
constituído em mais de 99% por micro e pequenas unidades e salpicado, tão só,
por pouco mais de uma dezena de grandes empresas.
Acontece que as MPME do distrito, bem como as suas congéneres em todo o País,
vivem, a montante e a jusante da sua actividade, claramente determinante para a
vitalidade do mercado interno, no sufoco que resulta, em grande medida, da
acção crescente e em roda livre, dos grandes grupos económicos.
São as empresas de energia, da finança, das telecomunicações, dos transportes,
dos combustíveis, da grande distribuição e todas quantas, podem querem e
mandam, em reino de absoluta impunidade, porque contas, não lhes são pedidas.
Se tamanha colonização não bastasse, acresce a sanha persecutória de um
verdadeiro exército fiscal que, cumprindo ordens, gasta todas as munições para
desgraça dos mais desfavorecidos e se esquece de tributar os grandes e
facilitados lucros.
É, obviamente, insensata, injusta e indesculpável, a acção de um poder central
que põe em risco a sobrevivência de um número já alarmante de micro e pequenas
empresas e contribui, eficazmente, para o inevitável desemprego que alastra.
Falamos das MPME, exactamente, onde se situam mais de 70% dos empregos do
distrito e isso basta, para destacar a sua importância social e económica.”
Políticas
que discriminem de modo positivo as MPME
Que medidas seriam de maior significado
implementar para valorizar as MPME no País e região?
“Socorrendo-me do Plano de Acção para o mandato que agora se inicia, que embora
tendo como lastro os princípios e objectivos que orientaram os mandatos
anteriores, reflete, a determinação que o estado de emergência exige.
Assim:
- Vamos bater-nos por um diálogo, que não sendo de surdos, como é habitual, nos
dê retorno das diferentes instituições, particularmente, das sediadas no poder
central.
- Vamos, no plano institucional, pressionar a Assembleia da República e o
Governo, tendo por objectivo, políticas que discriminem de modo positivo as
MPME, nomeadamente:
- extinção do PEC - Pagamento Especial por Conta;
- diferenciação fiscal positiva, em sede de IRC, das Micro, Pequenas e Médias
Empresas;
- aprovação de Regime Simplificado de Tributação - RST, com taxas diferenciadas
de acordo com os coeficientes técnico-científicos a apurar e publicar, para
cada ramo de actividade;
- redução progressiva das taxas de IVA, reposição da taxa de 13% na
restauração, reembolso simplificado e célere do IVA e entrega só após boa
cobrança;
- simplificação do acesso ao crédito bancário regulado por instituição pública,
onde a CGD assuma um papel decisivo;
- revisão urgente do Decreto-Lei 12/2013, por forma a ter eficácia mínima,
junto de quem necessita e tem carreira contributiva;
- medidas também urgentes, que promovam e animem o mercado interno, as suas
MPME, em todos os sectores e com aproveitamento dos recursos nacionais;
- e ainda, afirmar, com veemência, o estatuto de Parceiro Social e consequente
assento, como confederação empresarial, nos organismos institucionais
existentes bem como nos que venham a ser constituídos.
Enquanto a CPPME não for reconhecida, de pleno direito, como Parceiro Social no
Conselho Económico e Social (CES), a democracia participativa queda mutilada
porque a centenas de milhares de micro, pequenos e médios empresários se mantém
vedado o acesso de seus representantes ao actual CES.”
Fundos Europeus-2020 - expectativas são de
escasso optimismo
Como encara a CPPME os apoios que são
perspectivados no âmbito dos fundos Europeus-2020?
“A CPPME empenhar-se-à, conforme decorre do seu Plano de Acção, para capacitar
as organizações representativas das MPME na elaboração de projectos e
candidaturas a apoios no âmbito dos fundos europeus-2020.
Acontece que as nossas expectativas são de escasso optimismo.
A prática, lamentavelmente já institucionalizada de compadrio, neste tipo de
procedimentos, faz-nos recear que um sem número de grandes empresas, desatem a
entrar em trabalho de parto,e surjam, com previsível oportunidade,
"startup´s" de conveniência.
Também, jovens, "qualificados" nas universidades de verão e/ou menos
jovens, igualmente "qualificados" nas universidades de fim de semana,
surgirão com um tal entusiasmo empreendedor que a generosidade, dos gestores
dos fundos 2020, não irá por certo frustrar.
Acontece ainda que há um sem número de pequenas empresas não elegíveis por
razões sem razão. Tomemos, para ilustrar esta perversa situação, os casos de
empresários que, entrando em rotura de tesouraria, deixam de cumprir os seus
deveres fiscais porque o Estado lhes deve e/ou porque o Estado os considera em
dívida, por exemplo, de IVA de facturas ainda não cobradas.
As nossas expectativas não podem deixar de ser, com realismo, muito escassas”.